10 de junho de 2011

História

Era uma vez um pedacinho de magma. Pedacinho esse que sonhava ver o mar, coisa improvável de acontecer por aquelas bandas, já que a astenosfera, o lugar onde ele vivia, ficava muito, muito, muito longe da superfície. Ele andava sempre muito atarefado, a passear de um lado para o outro, daqui para ali, com todos os outros pedacinhos de magma.

Era uma vida bastante monótona, considerava ele, sempre que ouvia as aventuras que outros pedacinhos lhe contavam sobre as suas viagens á superfície. Contavam-lhe que já tinham sido peixes, outros corais num enorme e majestoso oceano, que tinha mergulhado para as profundezas da terra, e que, depois de uma longa viagem, tinham vindo parar á astenosfera, transformados em pedacinhos de magma.

Como ele desejava sentir a adrenalina de ser puxado pelas correntes marítimas, de ver criaturas diferentes como baleias e tubarões, barcos e surfistas! Mas isso de nada lhe servia. Iria continuar retido debaixo da terra, e de todas essas magnificas coisas.

Até que, num certo dia, tudo começou a tremer. Toda a zona ficou uma confusão! Os pedacinhos de estavam todos baralhados, mas mesmo assim, muito curiosos. O que estaria a acontecer?! O que seria que os estava a “empurrar” para cima com tanta força?! Dava a sensação que o “céu” estava partido numa grande racha. Como é que isso seria possível?!

O pedacinho de magma estava tão feliz! Era a sua oportunidade… Já tinha ouvido rumores que este tipo de fenómenos tinha ocorrido em regiões próximas, e que era uma grande porta para a superfície! Não podia ficar para traz! Tinha de seguir os outros pedacinhos! E lá foi ele, muito corajoso, em direcção á grande racha, ansioso para ver o que o esperava…

Estavam todos muito apertados e andaram quilómetros e quilómetros a abrir caminho por entre as rochas até se cansarem e pararem, formando uma grande e incandescente bola de pedacinhos de magma. Repousaram durante uns tempos, ate terem a certeza que estavam prontos para continuar, e então, com um grande empurrão, recomeçaram a “desbravar” o caminho num grande túnel que se ia tornando cada vez mais comprido.

Ao atravessarem a frágil linha do solo, tiveram a certeza que tinham chegado ao seu destino, e com o impulso da subida começaram a amontoar-se, uns atrás dos outros em escoadas de lava que pareciam intermináveis.

Passou-se anos e continuavam todos no mesmo lugar, a arrefecer lentamente, sem se poderem movimentar. A maioria estava felicíssima! Tinham vindo até á superfície, “mudar de ares”, ver o sol e o céu. Agora já tinham uma história que valesse a pena contar, já tinham vivido uma aventura. Já estavam satisfeitos.

Todos menos aquele pequeno pedacinho de magma que agora se tinha tornado, como todos os outros, num pedacinho de rocha. Ele estava desiludido… Todas aquelas histórias que lhe tinham contado sobre a superfície e o mar pareciam tão excitantes! E ele que tinha vindo nesta viagem, mesmo para isso, para viver uma história como aquelas, estava sujeito a ficar ali, imóvel, para sempre, sem nunca ter conhecido o mar, nem tão perto vivido a sua aventura.

Ficou muito triste, e foi assistindo ao passar do tempo: ás mudanças de estações, ao movimento das nuvens, ao nascer e pôr do sol… O seu único consolo era a chuva. Aqueles milhões de gotinhas que constituíam o mar faziam-lhe bastante companhia. Havia alturas que caíam incessantemente á sua volta, e era nesses momentos que ele se punha a imaginar a forma, o tamanho, até o cheiro que teria o seu tão amado oceano. Parecia que o estavam a desconjuntar, que o desgastavam e atingiam com o desapontamento que sentia de todas as vezes que se punha a pensar nisso.

Isto passou-se até um dia, acordar e ao olhar para o lado, ver que estava em movimento. Ele e os seus companheiros estavam, pela primeira vez, separados. Desciam um grande vale, aos saltinhos e rodopios, pois era o vento que os impulsionava para a frente. Era uma sensação incrível! Estavam a voar, como os pássaros que durante tanto tempo observavam por cima das suas cabeças.

Isto prolongou-se durante meses, e meses a fio. Não sabiam para onde estavam a ser transportados, nem lhes importava, limitavam-se apenas a observar e a deixar-se levar.

Num certo ponto do seu percurso, ouve algo que chamou á atenção da maior parte deles. Uma grande mancha azul cobria o horizonte á sua frente, e foi com grande surpresa que o pedacinho de rocha a reconheceu como sendo o MAR! O brilho e a felicidade voltaram a preencher os seus olhos e a sua boca formou um grande sorriso de orelha a orelha. Afinal, ao contrário do que pensara, ia realizar o seu sonho!

Começou a contar os segundos e os metros que os separavam e á medida que se aproximavam ia gritando de alegria. E no momento em que ele e os outros pedacinhos de rocha mergulharam na água fria, ele sentiu que nada poderia arruinar aquele momento.

Mesmo dentro de água continuaram a ser levados pelas correntes, e nenhum deles perdia um detalhe que fosse do que quer que passasse á sua frente. Estudavam cada espécie de peixe e cada planta, num processo que demorou dias.

Pararam, por fim e foram depositados numa cova que se encontrava no chão. Voltaram a apertar-se uns contra os outros, ocupando o menos espaço possível, para os que ainda não tinham chegado tivessem lugar, enquanto discutiam as suas opiniões e ideias sobre o que tinham observado.

O espaço entre eles era tão pequeno que a maior parte da água migrou para as camadas superiores e a restante fez com que se forma-se uma espécie de pasta. Voltaram, portanto, a agrupar-se á medida que eram empurrados para baixo com o peso de todos os outros pedacinhos.
Eles estavam a ficar quase que esmagados uns contra os outros com a chegada constante de mais pedacinhos, e para não se magoarem, decidiram reorganizar-se, pedindo ajuda aos fluidos circulatórios que eram agora seus vizinhos. Estes ajudaram prontamente sempre muito simpáticos e acolhedores, tentando que todos se sentissem o mais confortável possível.

O pedacinho estava radiante. Tinha, finalmente, realizado o seu grande sonho. Já tinha uma história, uma aventura, uma viagem que contar a quem o quisesse ouvir. Tinha gravado tudo na sua cabeça, até os pequenos detalhes. Estava agora numa nova casa, com novos amigos com quem partilhar as suas ideias, e, sentia que todas as partes da grande jornada por que passou tinham sido fundamentais, para chegar onde chegou. E quem sabe se não haveria mais para acontecer?!


FIM!

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